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Fundação Nadir Afonso

NADIR AFONSO - laurafonso@sapo.pt

Fundação Nadir Afonso

NADIR AFONSO - laurafonso@sapo.pt

31
Jul12

Nadir Afonso, geometria e invenzione

Laura Afonso

12/7/2012

Nadir Afonso, geometria e invenzione

A Roma un’esposizione dedicata al pittore e architetto portoghese. In mostra i suoi dipinti, dall’esperienza surrealista all’astrattismo, e quelli di amici artisti, oltre ai progetti realizzati in collaborazione con Le Corbusier e Niemeyer

Nadir Afonso, Electra e Oreste, 1996, Guache sobre papel, 27,5x32,5 cm
Nadir Afonso, Electra e Oreste, 1996, Guache sobre papel, 27,5x32,5 cm
Dal 18 luglio al 30 settembre, il Museo Carlo Bilotti di Roma rende omaggio al grande pittore, architetto e filosofo portoghese Nadir Afonso, nato a Chaves nel dicembre del 1920, con una mostra curata da Stefano Cecchetto. L’esposizione ha preso forma due anni fa in occasione dei novant’anni di Nadir Afonso, che sono stati celebrati dalla Fondazione istituita dall’artista stesso, attraverso l’ideazione delle rassegne da presentare a Parigi, Rio de Janeiro e Lisbona: in Italia le tappe saranno due; dopo Roma, seguirà la presentazione a Venezia, in occasione della Biennale di Architettura, che approfondirà la figura di Nadir Afonso quale architetto e artista, nonché le sue collaborazioni con Le Corbusier e Oscar Niemeyer.
Come sottolineato dal titolo stesso dell’esposizione, “Nadir Afonso. Architetto, pittore e collezionista”, la rassegna non guarda solo alla produzione pittorica dell’artista portoghese, ma anche all’attività di collezionista, esponendo anche opere degli amici artisti con i quali ha lavorato, conosciuti durante i soggiorni in Brasile e Francia: difatti, dopo la formazione presso l’Accademia di Belle Arti a Oporto, si trasferì a Parigi, divenendo amico e collaboratore di Le Corbusier, con il quale lavorò dal 1946 al 1951, e quindi a Rio de Janeiro, al seguito di Oscar Niemeyer, con cui collaborò tre anni, conoscendo, inoltre, l’artista italo-brasiliano Candido Portinari. Nel 1954, l’artista tornò nella Ville Lumière dove partecipò a numerose mostre di pittura alla galleria Denise René, conoscendo Pablo Ricasso, Max Ernst, Giorgio de Chirico, Max Jacob, Fernand Leger e molte altre illustri personalità dell’epoca.
Nelle sale del Museo Carlo Bilotti, l’itinerario espositivo ricrea l’atmosfera di fervore del secondo Novecento, periodo in cui la confluenza tra i generi e lo scambio intellettuale fu certamente il motore di importanti innovazioni in campo artistico. Lo stesso Nadir prese parte al dibattito sull’estetica dell’arte, pubblicando diversi libri, quali Les Mécanismes de la Création Artistique, La Sensibilité Plastique, Aesthetic Synthesis, Le Sens de L’Art, Universo e o Pensamento, The arts: erroneous beliefs and false criticisms, Nadir Face to Face with Einstein.
Il percorso rende visibili le opere di alcuni degli artisti che facevano parte dell’entourage di Afonso, quali Pablo Picasso, Max Ernst, Candido Portinari, Giorgio de Chirico, Max Jacob, Fernand Legér. In particolare, le opere scelte richiamano il clima barocco della città e della poetica metafisica, in quanto vogliono approfondire la lezione dechirichiana che ha molto influenzato l’espressionismo dell’artista: Nadir Afonso partiva, difatti, dall’esperienza surrealista, dopo il periodo barocco che, arriva fino alle ricerche pittoriche dell’amico Giorgio de Chirico, per giungere poi all’astrattismo e concentrare le sue ricerche su rigorose costruzioni geometriche che rimandano allo spazialismo e al costruttivismo degli anni Sessanta fino all’esperienza di artisti quali Victor Vasarely, Richard Mortensen, Auguste Herbin e André Bloc.
In particolar modo, l’itinerario mette in rilievo il lavoro contemporaneo dell’artista e la produzione degli ultimi dieci anni, presentando, tra le altre opere, Florença del 2006, Kuala Lumpur del 2008, Toronto del 2007, e Citade Incerta del 2010, in cui l’artista esplora un nuovo linguaggio delle forme, attraverso l’apparizione di un’architettura in divenire, tra linee rette e ondulate dagli accesi cromatismi.



27
Fev11

Geometria

Laura Afonso

 

Platão disse: «Por toda a parte existe geometria».

 

Euler acrescentou: «Mas é preciso olhos para vê-la».

 

Lagrange, reafirmou: «E inteligência para compreendê-la».

 

Malba Tahan concluiu «E alma de artista para admirá-la».

 

 

 

11
Ago08

Entrevista a Nadir Afonso: “A Geometria é fonte de harmonia”. Por: Patrícia Posse

Laura Afonso

Foto: Patrícia Posse Nadir Afonso

Pintor flaviense em Entrevista ao Mensageiro

Faz questão de se apresentar como transmontano aonde quer que esteja e defende a lógica matemática como alicerce de toda a obra de Arte. Eis as linhas-mestras de Nadir Afonso, o pintor flaviense que se tornou numa referência no panorama artístico contemporâneo. Formou-se em arquitectura na Escola Superior de Belas-Artes no Porto, mas a sua natureza sempre o impeliu para a pintura. É na tela que os seus dedos esguios se encarregam das pinceladas geométricas, traços distintivos do seu trabalho. Aos 87 anos, o artista fala do seu percurso, que conjuga, nos quadros, as leis universais da matemática para pintar a harmonia.

Mensageiro: Como começou a paixão pela pintura? Aos quatro anos desenhou um círculo na parede da sala… Nadir Afonso: Um ponto central equidistante dos pontos periféricos é uma forma perfeita, uma forma impressionante. Fui sempre muito atraído pela geometria, porque é um espectáculo de exactidão e ressoa no espírito como uma forte emoção de plenitude.

M: Sempre procurou esse “espectáculo de exactidão” nas suas obras? N.A: A essência da obra de arte está na exactidão matemática, que nos cria a emoção que transcende a obra inartística. Na Natureza, temos qualidades de perfeição, de evocação e de originalidade que todo o homem sabe reproduzir na tela. O que distingue o artista do homem comum é a quarta qualidade: a harmonia, que não está no objecto, mas na forma geométrica, que emprega leis matemáticas. É essa qualidade que suporta todas as outras e as eleva ao nível da arte. A harmonia realça as outras qualidades e sentimos a perfeição mais justa, sentimos a evocação mais sincera, sentimos a originalidade mais espontânea.

M: Como é que o artista aprende essas leis da Natureza? N.A: São apreendidas de uma maneira perceptiva, não são racionalizadas. Muitos artistas não têm consciência de que estão a fazer matemática. É uma intuição que os conduz à geometria, sem que estejam conscientes disso. Eu estou, porque passei a vida toda a magicar sobre isso.

M: Por detrás de um quadro, questionava-se com frequência? N.A: Comecei a querer compreender as coisas, a passar da intuição para o raciocínio claro das leis que regem a obra de arte. Nunca vi ninguém debruçado sobre estes problemas. Estetas tão conhecidos como Kant ou Hegel e tantos outros falam de tudo e não há uma palavrinha sobre as leis. Eles não se apercebem que há leis matemáticas na criação da obra de arte. Meditam, mas, como não trabalham com as formas, o essencial escapa-lhes.

M: Ao trabalhar com as formas, acabou por descobrir uma veia filosófica dentro de si? N.A: Trabalhando as formas, o homem é trabalhado por elas e depois, pouco a pouco, tenta elevar ao nível do raciocínio esses impulsos intuitivos. Foi o que eu fiz. Na arte, os estetas erram, todos eles, porque não vêem que há uma lei geométrica subjacente, que dá harmonia à obra de arte. A geometria é fonte da harmonia.

M: Afirmou que um arquitecto é sempre condicionado, porquê? N.A: Um arquitecto tem que responder a uma câmara municipal que controla onde ele pensa projectar a obra. Há uma série de condicionantes e isso limita a criatividade.

M: Que aprendizagens é que ficaram do convívio com os arquitectos Le Corbusier e Óscar Niemeyer? N.A: Ter que trabalhar em arquitectura foi penoso. É claro que aprendi muito com eles, mas se não fosse o meu trabalho pessoal isso arredondava em zero. Eles falavam e nós íamos ouvindo, mas não é por aí que se tem a percepção da obra de arte. A intuição própria, essa é que é a grande matriz. Só trabalhando as formas é que se acaba por perceber o mecanismo da criação.

M: A geometria das suas obras poderá ser uma herança do seu trabalho na arquitectura? N.A: Tenho impressão que não tem grande influência. Acho que trabalhando as formas, pouco a pouco, uma pessoa vai sentindo que há leis. Muitos pintores não têm essa preocupação de se auscultar, de se interrogarem a si próprios. Eu tive sempre essa preocupação.

M: A opção pelo abstraccionismo geométrico advém desse fascínio que tem pelas leis da matemática? N.A: Quando estou num café ou em qualquer parte e estou alheado do mundo, pego num lápis e vem sempre geometria. Surpreendo-me sempre a pôr um quadrado circunscrito e ver as harmonias que ressaltam desse jogo puramente arbitrário. Pouco a pouco, estou a procurar harmonias. Há um mundo infinito de harmonias na geometria e que as pessoas não se apercebem.

M: Foi para transmitir essas relações que fez acompanhar a sua obra de publicações? N.A: Tenho escrito muitos livros e ninguém dá importância nenhuma. Mas tenho a impressão de que com o tempo os meus livros vão acabar por ser lidos e compreendidos. A partir daí, as pessoas ficam a saber que sem trabalho pessoal não há obra de arte. Mais tarde ou mais cedo, os princípios vão penetrar nas escolas de Belas-Artes e os alunos já não vão convencer-se a si próprios que estão a lançar na tela o seu mundo interior, a sua alma, isso é uma vigarice.

M: “A Arte é um mistério.” Refutou esta afirmação de Einstein, mas fica tudo a descoberto num quadro? N.A: Não há nada de misterioso na Arte. Apreender as leis que regem uma obra de arte é uma diligência extremamente difícil. É preciso trabalhar durante dezenas e dezenas de anos para começar a sentir na obra de arte essas leis.

M: Há algum privilégio pelas cores? N.A: As cores também têm uma dimensão geométrica. Por exemplo, se o fundo é branco, ponho um triângulo preto. Tem uma certa força. Mas se, em vez do preto, ponho um amarelo, aquele triângulo perdeu a força, ainda que o tamanho seja o mesmo. A cor joga na composição como elemento geométrico e eu sinto isso.

M: Como é quando pega no pincel em frente à tela? N.A: Não sei o que vou pintar. A primeira forma é arbitrária, agora a segunda forma já está a jogar com a primeira.

M: Tem que haver relações de afinidade com todos os elementos do quadro? N.A: Tem que haver relações matemáticas. Por isso, a última forma é a mais difícil, já que tem uma série de tensões matemáticas a justificá-la. À medida que vou acrescentando formas, elas vão-se justificando umas às outras. A última forma é já o resultado matemático de todas as outras. É única, não há duas hipóteses.

M: Portanto, o mais difícil é chegar à última forma? N.A: A última forma é o diabo, porque é já solicitada pelas outras. A prova que há matemática é a última forma, que é difícil de apanhar. Estou 20 anos sem ver um quadro e hoje já o vejo melhor. O indivíduo vai perdendo as qualidades. Para pintar, canso-me, dói-me a coluna, mas sinto que a sensibilidade se vai agudizando.

M: Do seu período artístico, qual foi o que mais o marcou? N.A: Sou muito atraído pela geometria das cidades. Como viajei bastante, acho que é uma coisa interessante, pois são ricas em formas geométricas.

M: Mas disse: “é de minha casa que vejo todas as cidades”… N.A: É, porque no fundo acontece o seguinte: vamos a Berlim, vemos a cidade, ficam certas imagens. Mas, depois, é no atelier que isso se reforça, pinto aquilo que ficou. É em casa que uma pessoa retoca e compõe.

M: “O artista não realiza nenhum trabalho, enquanto o trabalho não realiza o artista”, palavras suas. Qual é o trabalho que o fez sentir mais realizado? N.A: O quadro “Apolo” [agora exposto em Boticas], que saiu facilmente. As leis ordenaram-se praticamente sem grande esforço, saiu quase espontaneamente. Às vezes, é o contrário.

M: Hoje contraria a afirmação do contínuo, que lhe recomendou o curso de arquitectura, de que “a pintura não alimenta o Homem”? N.A: A pintura pode alimentar o Homem. Ele enganou-se. Ainda me lembro das palavras dele: “vá para arquitectura” e eu, cobardemente, segui o seu conselho. Fiz mal. Incompatibilizei-me com o meu mestre, o professor Carlos Ramos, que até me reprovou, com o pretexto de que eu tinha falta de paciência. Geralmente, o arquitecto trabalha em estiradores horizontais, mas eu punha-o na vertical e pintava. Fiz muitos disparates enquanto era aluno de Belas-Artes, no Porto. M: O que é que fica de si em cada trabalho que produz? N.A: Depende. Se sentir que criei uma obra, fico satisfeito, pois ainda estou a criar coisas bonitas. Há orgulho nisto. Ou então, muitas vezes, penso que errei e considero que não fiz coisa nenhuma. Às vezes, as coisas encadeiam-se facilmente. Por sorte talvez, sai a eito. Mas é curioso, quando um quadro nos dá muito trabalho ficamos com a sensação de que é melhor que os outros, porque nos custou mais. Mas depois, reflexão feita, vemos que afinal o esforço nem sempre compensa.

M: Está inerente a cada quadro que pinta uma busca de equilíbrio? N.A: Há sempre uma busca inconsciente de equilíbrio. Muitas vezes, a pessoa repara que conseguiu e, no entanto, pareceu-lhe que não conseguiu. Há muitas hesitações na Arte, tactear até encontrar, sem nunca ter certezas. Só muito tarde é que me surpreendo a olhar para um quadro meu e a dizer “por acaso acertaste, como é que tu conseguiste isto?”. Patrícia Posse

Quadros XL de Nadir Afonso

Mostra inclui quatro obras inéditas A exposição “Nadir Afonso XL” foi inaugurada na última segunda-feira, dia 4, no átrio dos Paços do Concelho de Boticas. Esta é a primeira vez que o pintor flaviense expõe exclusivamente quadros de grande formato, que, desde o início deste século, caracterizam uma nova etapa do seu percurso artístico. “Estes quadros têm mais impacto sobre o público. O trabalho de composição faço-o a uma escala pequena, depois vou ampliando. Esse trabalho de ampliação já não é um trabalho artístico, é algo secundário, porque a elaboração da obra obedece a leis matemáticas e é feita à escala do guache. A ampliação é uma diligência puramente mecânica”, explicou Nadir Afonso. Os visitantes poderão contemplar nove quadros em acrílico sobre tela de grandes dimensões, quatro dos quais inéditos (“Dusseldorf”, “Kuala Lampur”, “Toronto” e “Sienna”), realizados já no século XXI. O artista fez questão de sublinhar que “a obra de arte é tacteada, é uma labuta, uma procura”. “Não é a inteligência que elabora a obra de arte, é a intuição artística, uma intuição puramente sensível que apreende as leis da matemática que estão na geometria das formas”, acrescentou. As obras em exposição pertencem ao acervo da Fundação Nadir Afonso e vão estar patentes de segunda a domingo, das 9h às 13h e das 14h às 17h30, até dia 29 de Agosto. No edifício da autarquia, os visitantes vão poder ainda apreciar aquele que é um dos maiores painéis em azulejo feitos pelo artista, com 11 por 2,4 metros.

01
Dez07

A Quadratura do Círculo - Texto de Vladimiro Nunes publicado in SOL

Laura Afonso
Arquitecto acidental, trabalhou com Le Corbusier e Niemeyer, mas o nome de Nadir Afonso fez-se nas telas.
Alguém toca à campainha. Laura, a mulher do pintor, levanta-se e abre a porta ao carteiro. Nem de propósito, a correspondência endereçada a Nadir Afonso traz selos desenhados pelo próprio. Os três selos em questão – de 30, 45 e 61 cêntimos – fazem parte de uma nova série consagrada a Grandes Artistas Portugueses.
Prestes a completar 87 anos, Nadir Afonso conquistou há muito um estatuto especial na arte portuguesa, mas nem por isso anda menos irrequieto. Pelo contrário, a sua mais recente exposição – Futuro, que pode ser vista na Galeria Diário de Notícias, em Lisboa, até 24 de Novembro – é composta por obras recentes, incluindo as duas maiores telas que alguma vez pintou, com mais de dois metros de comprimento por outro tanto de largura. «Cheguei à conclusão de que um indivíduo se sente mais tocado por um quadro de grandes dimensões. Confesso que eu próprio, quando vejo um, me sinto mais dominado por ele, porque tem mais força. O volume também impressiona, não é só a composição».
Entre a infância e a adolescência, aplicou-se em «copiar» o mais fielmente que conseguia as formas da natureza, até tomar consciência de que «a obra de arte não estava na representação dos objectos». «Por volta dos 17 ou 18 anos, pus-me a pensar que tinha de haver mais alguma coisa. E pensei, na minha ingénua idade, que a alma, o espírito do artista, também era expresso». Mais tarde, chegou à conclusão contrária. «Como fui sempre muito coca-bichinhos, comecei a magicar que não era a alma, que tinha de haver leis. Depois de muito trabalhar e ‘cocar’, percebi que as leis eram as da geometria: as do quadrado, do círculo, do triângulo».
Foi assim que chegou ao abstraccionismo geométrico, a que tem dedicado toda a sua obra. A casa espaçosa onde vive e trabalha, em Cascais, está repleta de telas, guaches e escritos teóricos. Os muitos livros que escreveu, resume-os nesta frase: «A perfeição, a originalidade, a evocação, todas essas qualidades naturais nos emocionam, mas são subjectivas. A quarta qualidade, a ‘morfometria’, a matemática, a pura harmonia das formas, é imutável e realça as outras qualidades. Aí é que está a arte». Ao contrário do que se possa pensar, afirma Nadir, o rigor não exclui o sentimento. «A geometria é um espectáculo de exactidão, mas também é muito emocionante. Quando estou triste, não vejo televisão. Pego num círculo e começo a olhar-lhe para o centro. Ou a harmonizar um quadrado com um círculo. Isso consola-me e acalma-me».
Nome cigano
Segundo filho do poeta Artur Maria Afonso e de sua mulher, Palmira Rodrigues Afonso, Nadir nasce na Rua dos Codeçais, em Chaves, a 4 de Dezembro de 1920. O nome, pouco vulgar, deve-o a um encontro acidental. «O meu pai pega em mim e leva-me ao Registo Civil, no centro da cidade. No caminho, encontra um cigano amigo dele. ‘Então Artur, onde vais?’. ‘Vou ali registar o meu filho’. ‘E que nome vais pôr ao rapaz?’. ‘Orlando’. ‘Orlando?! Muito Orlando há-de ser ele! Põe-lhe antes Nadir’. O meu pai lá pensou que o homem tinha razão, chegou ao registo e pôs-me ‘Nadir Afonso Rodrigues’».
Em casa, o irmão Lereno, um ano e meio mais velho, passa a chamá-lo Riri (a primeira sílaba lê-se como a segunda) e o diminutivo acompanha-o ao longo de toda a infância. Temperamental e idealista, Riri sonha ganhar asas, ser rei. Na inconsciência dos seus quatro anos, ignora que a primeira pintura é já um auspício das que hão-de vir. «Foi na sala de uma casa antiga onde vivi na minha infância em Chaves. A parede era branca e lembro-me perfeitamente de pegar num pincel e em tinta e de fazer um círculo vermelho na parede. A minha mãe veio e repreendeu-me. ‘Sujaste a parede, Riri?’. ‘Ó mãe, como é que eu era capaz de fazer um circulo tão bem feitinho?’. Ela encabulou-se e pensou que realmente não podia ter sido eu. Só anos mais tarde é que confessei».
Depois de concluir o liceu em Chaves, Nadir ruma à Escola Superior de Belas-Artes do Porto. Tem 18 anos e está decidido a fazer-se pintor, mas falta-lhe aprender que o caminho para a realização pessoal não se percorre em linha recta. Nesse tempo, embora os cursos de arquitectura e de pintura sejam ministrados no mesmo estabelecimento, há entre eles uma diferença abissal: para ingressar no primeiro, é necessário o curso dos liceus; para frequentar o segundo, a instrução primária é quanto basta.
Alheio a tudo isso, o candidato apresenta-se na escola, num dia de Setembro, para fazer a inscrição. «Levava na mão o requerimento dirigido ao director: ‘Eu, fulano de tal, venho respeitosamente requerer a V. Exa. que se digne a aceitar-me como aluno de pintura’. À entrada estava um funcionário sentado a dormitar. Perguntei-lhe onde era a secretaria e ele puxa-me do requerimento, lê-o e diz-me: ‘Ó homem, então você tem o curso dos liceus e vem inscrever-se em pintura? A pintura não alimenta o seu homem. Inscreva-se em arquitectura’. Aquilo meteu-se em mim e eu, cobardemente, porque o funcionário me tinha assustado, vim cá fora, rasguei o requerimento, e fiz outro: ‘Eu, fulano de tal, venho respeitosamente requerer a V. Exa. que se digne e aceitar-me como aluno de arquitectura’».
Mesmo depois de trocado o cavalete pelo estirador, Nadir não deixa nunca de pintar. Em Abril de 1946, na ressaca da Segunda Guerra Mundial e quando lhe falta ainda defender a tese de fim de curso (só o fará dois anos mais tarde), parte para Paris. «Fui de Irun [Espanha] a Hendaye [França] a pé, porque não havia ligação por comboio. Fui pela linha férrea afora e atravessei a fronteira, uma ponte do Inferno!». Enroladas debaixo do braço, vão algumas das suas telas, para lhe servirem de cartão-de-visita. À chegada, instala-se no Quartier Latin, consegue uma bolsa de estudo do Governo francês, inscreve-se no curso de pintura da École des Beaux-Arts e mergulha de cabeça na vertigem da arte.
Mortos, Corbusier e Niemeyer
Em Paris, Nadir tenta vingar como pintor. Debaixo de uma chuva miudinha de Novembro, dirige-se à Rue de Seine, feudo de pintores onde, porta sim, porta não, há galerias para ver. Na primeira em que entra, depara-se com uma madame sentada à secretária e mostra-lhe os seus quadros. Nada. Nem uma nesga de expressão, só a completa apatia de um par de olhos fixos no vazio. «Perguntei-lhe se não havia por ali um pintor e ela indicou-me um tipo sentado ao fundo da galeria, para aí com a idade que eu tenho hoje». Aproxima-se e torna a exibir os quadros. Mais uma vez, nada de reacção. «Quando o tipo nem ligou a ponta de um chavelho ao que lhe estava a mostrar, gritei ‘Vous êtes des morts!’ – ‘Sois todos uns mortos!’ e saí porta fora».
Nadir não desarma e entra na segunda galeria, apenas para encontrar «outras duas tipas execráveis». Como se não bastasse, a madame da primeira vez, despeitada, resolvera segui-lo e diz às vizinhas: ‘Já vi essa pintura e é uma grande porcaria!’. «As três desnalgaram-se a rir, numa chacota de tal maneira violenta que eu peguei nas telas, desapareci e jurei a mim próprio: ‘Tu nunca mais mostras isto a ninguém, pá! Acabou’. E acabou mesmo. Nunca mais saí para mostrar a minha banha da cobra a ninguém». O juramento mantém-se até hoje: nunca uma exposição de Nadir se deve a iniciativa própria.
Desmoralizado, começa a pensar em formas de «ganhar uns dinheiros». A arquitectura volta a impor-se como alternativa à penúria. «A ideia que me veio à cabeça foi trabalhar com Le Corbusier, uma vez que já tinha tido contacto com a obra dele nas Belas_artes do Porto. Procurei o endereço dele, 35, Rue de Sèvres, e lá fui eu». Mesmo sem diploma, consegue ser recebido pelo arquitecto-chefe do ateliê, André Wogenscky, de quem viria a tornar-se amigo para vida. Começa a trabalhar no dia seguinte. «A guerra tinha acabado há pouco e ainda andavam a organizar o ateliê, que ainda estava nos princípios. Fui dos primeiros colaboradores de Corbusier [que era suíço] em Paris».
«Le Corbusier era amigo do seu amigo, mas não admitia que alguém lhe fizesse sombra. Como todos os indivíduos geniais, era um egocêntrico. Era capaz de gestos de uma grande amabilidade, mas se lhe falassem em tipos importantes, importante era ele. Tinha coisas do diabo, aquele homem». Apesar do temperamento instável, o Mestre, também ele artista, permite que Nadir dedique as manhãs à pintura sem lhe descontar no ordenado. Durante algum tempo, serve-se do ateliê do célebre pintor cubista francês Fernand Léger (1881-1955). Mas «o afastamento em que se vive nos grandes meios de arte» levam-no a uma encruzilhada.
Ao receber a vista de um grupo de brasileiros luso-descendentes, é incentivado por Manuel Machado, colaborador de Oscar Niemeyer, a partir para o Rio de Janeiro. A 14 de Dezembro de 1951, embarca para o Brasil e inicia uma colaboração de três anos com o criador de Brasília. «Niemeyer é, como Corbusier, um génio, mas, ao contrário deste, tinha um trato menos polido para com os colaboradores. Tinha bom carácter, mas exaltava-se facilmente e era bastante espirra-canivetes, muito impulsivo». O sufoco de uma vida dupla, dividida entre os constrangimentos da arquitectura e a obsessão da pintura, há-de durar até 1965. Só então abandona de vez o estirador para se dedicar em exclusivo à sua obra plástica e teórica (escreve mais de uma dezena de livros).
A angústia do último traço
Hoje, Nadir já não cria quadros de raiz. Só a quantidade de desenhos e guaches à espera de serem aperfeiçoados e passados à tela davam para preencher muitas mais vidas. O processo pode demorar anos ou décadas, porque «há sempre qualquer coisa que não está bem». Por isso, as pinturas não têm data. São obras em aberto, equações incompletas, sempre sujeitas ao escrutínio matemático do pintor. «Um quadro só está pronto quando cessa de me oprimir», disse em entrevista recente ao Diário de Notícias.
Pelo contrário, angústia do papel em branco foi coisa que nunca teve. «No início, o raciocínio não intervém. O primeiro impulso é automático, arbitrário, não exige esforço. A cor não interessa, nem a imaginação. É o vazio completo. Pego no lápis que me veio à mão e sai o que sair. À medida que vou acrescentado mais traços é que se vão criando relações matemáticas. Depois o último traço é que é o diabo, porque está sujeito a toda a matemática interior da composição».
Os dias de Nadir começam cedo, por volta das oito da manhã – às vezes antes, se, como acontece com frequência, tiver dificuldades em dormir. «A primeira coisa que faço é olhar para as imagens. Vou às estantes onde tenho guaches e passo-os em revista, até que algum me choca e eu o retoco». Parar é que são elas.«É precisa uma grande ginástica mental. Se pudesse, depois do almoço, já não voltava». Mas volta, e não tem hora certa para largar o trabalho. «O meu relógio é a cabeça. Quando me começa a doer, obrigo-me a parar. Tem mesmo de ser. Se não, não durmo». Nadir sabe que precisa do sono, porque, quando acordar, aguarda-o um recomeço que nunca se esgota. É a lei do círculo a funcionar. Ininterruptamente.

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